Quase 8 mil pessoas vivem em situação de rua em 18 cidades da Região Metropolitana de Porto Alegre, apontam prefeituras
09/07/2025
(Foto: Reprodução) Levantamento foi feito pela RBS TV com base em dados dos municípios. Maioria dos municípios não tem abrigo fixo e especialistas cobram políticas públicas estruturadas. Moradores em situação de rua em Porto Alegre
Reprodução/RBS TV
A vulnerabilidade social nas ruas não é exclusividade das grandes cidades. Um levantamento da RBS TV com base em dados de prefeituras revela que cerca de 7,7 mil pessoas vive em situação de rua.
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Porto Alegre concentra quase 5,3 mil pessoas em situação de rua, segundo dados de fevereiro de 2025. Em outras 17 municípios da região, o número consultado pela reportagem gira em torno de 2,4 mil pessoas. Veja quais abaixo.
Em cinco desses municípios, as prefeituras afirmaram não ter casos ou relataram apenas situações pontuais.
Canoas – 1 mil
São Leopoldo – 279
Sapucaia do Sul – 234
Guaíba – 221
Gravataí – 200
Cachoeirinha – 200
Esteio – 200
Viamão – 90
Campo Bom – 54
Montenegro – 40
Igrejinha – 20
Santo Antônio da Patrulha – 15
Ivoti – 7
São Jerônimo – Casos pontuais
Eldorado do Sul – Nenhuma fixa
Nova Santa Rita – Nenhuma
São Sebastião do Caí – Nenhuma
De acordo com o Ministério Público do Rio Grande do Sul (MP-RS), apenas 15,9% dos municípios gaúchos possuem um plano municipal voltado à população em situação de rua. O dado foi publicado no fim de 2024 em um documento elaborado pelo MP-RS que ouviu prefeituras em todo estado. O levantamento ainda reforça a ausência de políticas públicas estruturadas.
Cerca de 1 mil pessoas em situação de rua em Canoas
Canoas é a segunda cidade da região com maior número de pessoas em situação de rua, cerca de mil pessoas. O município conta com um albergue municipal com 100 vagas, em funcionamento há 30 anos. Neste mês de julho, o local vai inaugurar uma lavanderia para que os usuários possam lavar e secar suas roupas.
O espaço também oferece cozinha, área de convivência e abrigo para animais de estimação. "Muitos não aceitam ir para abrigos porque não podem levar seus pets. Aqui, acolhemos também os animais, com tratamento e alimentação" explica o secretário de Assistência Social, Márcio Freitas.
Esse contato feito por profissionais, a preparação dos espaços e a acolhimento das pessoas que procuram os serviços são pontos essenciais para tornar a situação de rua transitória, oferendo aqueles que quiserem uma verdadeira oportunidade de deixar as ruas. Nilson Lira Lopes, coordenador do Movimento Nacional da População em Situação de Rua, reforça ainda que o atendimento deve ser individualizado e respeitoso. "A pessoa precisa ser ouvida. O psicólogo avalia o perfil e indica o serviço mais adequado. Muitos estão prontos para trabalhar, só precisam de oportunidade", afirma.
Para o coordenador Centro de Direitos Humanos e Proteção aos Vulneráveis do MPRS, o documento publicado pelo órgão é um incentivo para que o debate sobre o tema se estenda, não ficando restrito apenas aos períodos de maior frio, como inverno.
"Nesse momento, tem gente morrendo de frio. Então, é fundamental que se pense nessas pessoas. Mas que, para além desses momentos, a gente pense em como resolver essa situação. Com a estruturação de políticas públicas, com a estruturação de planos municipais, de comitês intersetoriais e um planejamento público nas mais diversas políticas que podem contribuir na superação da situação de rua", explica Menin.
Prevenção, garantia de direitos e superação
Para Leonardo Menin, do Centro de Direitos Humanos e Proteção aos Vulneráveis do MPRS, o enfrentamento da situação de rua deve ocorrer em três frentes: prevenção, garantia de direitos e superação. "A assistência social é uma abordagem técnica e ética que vai entender as vulnerabilidades e encaminhar para as políticas públicas necessárias", explica Menin.
Um dos dados obtidos pelo MPRS surpreende: 60,1% das cidades do estado não oferecem nenhum tipo de acolhimento fixo, como albergues, abrigos ou casas de passagem. Isso significa que menos de 20% das pessoas em situação de rua têm acesso a uma vaga institucional para dormir em noites frias.
Atuação na Região Metropolitana
Em São Leopoldo, não há atendimento espontâneo, que é quando qualquer pessoa pode procurar abrigo por conta própria. É a prefeitura quem realiza abordagens nas ruas e oferece os serviços diretamente. A cidade conta com uma república municipal com 54 vagas e está abrindo uma pousada com mais 30.
A secretária de Assistência Social, Simone Dutra, destaca que o atendimento é individualizado. "A gente verifica se a pessoa tem documentos, faz currículos, encaminha para o mercado de trabalho e até contata outras prefeituras, caso haja vínculos familiares em outros municípios", afirma a titular da pasta.
Segundo Simone, o número de pessoas em situação de rua caiu desde janeiro na cidade do Vale do Sinos. Das 289 pessoas abordadas, 103 foram domiciliadas — seja por voltarem a morar com suas famílias ou por encaminhamento para programas como o aluguel social. E 154 encaminhadas para o mercado de trabalho.
Edson Silva dos Santos é um dos beneficiados. Ele vivia em um barraco improvisado até conseguir uma vaga na república mantida pela prefeitura de São Leopoldo. O desejo de romper o laço com as ruas e a dependência química é motivado, principalmente, pelo desejo de se reconectar com a família. "Tenho vários projetos. Um é ver meus filhos de volta. Vou fazer por mim e por quem me deu oportunidade", diz Edson.
Em Esteio, não há albergues, mas a cidade mantém uma república desde 2018. O espaço tem dormitórios, cozinha, áreas de convivência e acompanhamento profissional. Antes de ingressar na república, os candidatos passam por uma pousada com pernoite diário. Se adaptados ao convívio, as regras e aos tratamentos de saúde oferecidos, podem conquistar uma vaga na república.
A secretária de Cidadania e Direitos Humanos, Katiane Marques, afirma que desde 2021, 39 pessoas superaram a situação de rua. "Algumas retomaram vínculos familiares, outras voltaram a estudar, trabalhar ou até se casaram", conta.
Quem atua na linha de frente das abordagens tem a vivência do drama que é estar em situação de rua e lutando contra a dependência química. Edson Jaime Nunes Linhares, conhecido como Edinho, é coordenador na Secretaria de Cidadania e Direitos Humanos de Esteio. O que mudou sua vida foi quase perder o filho recém-nascido.
"Meu filho tinha um mês de vida e estava com uma infecção generalizada, uma leucemia. A minha esposa estava com infecção na cesárea, não podia doar sangue, e eu estava drogado. Naquele dia, saí do hospital, olhei pro céu e pedi pra Deus: 'não leva ele pro senhor, deixa eu cuidar. Eu juro pro senhor que eu nunca mais vou beber, usar droga e vou ajudar todo mundo que puder'. Faz 10 anos que estou limpo”, relata Edinho.
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